Perdão: Que coisa difícil! (Mateus 6:14,15)

 

PERDÃO: QUE COISA DIFÍCIL!

Mateus 6:14,15

 

 

 

 INTRODUÇÃO

 

 O que entendemos por perdão? Enquanto os dicionários o definem como: quitar, anistiar e cancelar a culpa, no original grego existem duas palavras para explicá-lo:  Aphiemi  (deixo ir, liberto, remito, quito) e Apoluo (solto, despeço).

Vejamos algumas considerações sobre o perdão:

 

a)   a) Perdão é uma reação para com a ofensa e não uma reação negativa para com o ofensor (Atos 7:59,60); 

 b)   b) As ofensas podem se tornar em possibilidades para perdoar ou ficar amargurado;

 c)   c)  O perdão vê o ofensor como instrumento de Deus em nossa vida, para o exercício da misericórdia (Romanos 12:20);

d)    d) O perdão vê as feridas provocadas em nós como a maneira de Deus nos chamar a atenção para as necessidades do ofensor (Atos 16:23,27,31).

  

1.   PERDÃO NÃO É UMA EMOÇÃO, MAS UMA DECISÃO

 

 O perdão é um ato da minha vontade, e não das minhas emoções. Há momentos em que nossas emoções nos amarram, impedindo que perdoemos e, como elas são reações involuntárias, não são alavancas propulsoras para a prática do perdão.  É importante dizer que as emoções oscilam e nos enganam  (I Samuel 19:6,10,11). Confirmando a ideia, dizemos que o perdão é uma decisão que tomamos em não mais levantar a ofensa perante três pessoas: Deus, o outro e comigo mesmo.

Enquanto o perdão de Deus inclui o esquecimento das ofensas (Isaías 43:25), o mesmo não acontece com o nosso, aparecendo aí a grande dificuldade em trabalhar essa questão. Nós não temos a capacidade de uma amnésia seletiva; não podemos simplesmente arrancar do nosso arquivo mental certas pastas indesejáveis. Daí, termos a consciência de que o perdão é uma decisão de fé. E tem mais: por ser uma ordem bíblica, o perdão não pode ser opcional (Efésios 4:32).

Vamos ver um exemplo prático: o ato de perdoar é como soltar a corda de um sino que estamos puxando: decidimos soltar a corda, mas o sino continua balançando por algum tempo até parar. Assim, as memórias das ofensas normalmente persistem por algum tempo, mas o que não podemos fazer é pegar de novo a corda do sino. Outra realidade é que depois de resolvermos as questões do passado e tomarmos a deliberação de perdoar, corremos o risco de ser tentados a reviver as mágoas e as ofensas, o que fatalmente desembocaria no surgimento de amarguras.

 

2.   PERDÃO É A EXPRESSÃO DA NOSSA ESPIRITUALIDADE

 

O problema do coração, é o coração do problema:  esquecemos aquilo que deveríamos lembrar, e lembramos aquilo que deveríamos esquecer. São essas memórias amargas que precisam ser trabalhadas pela ministração da Palavra de Deus na nossa vida.

É interessante, no processo do perdão, rejeitarmos a ideia de desforra (Mateus 18:23-30), pois o perdão nos traz de volta para vivermos o presente. Ficamos libertos das feridas do passado, não que as ofensas do passado tivessem mudado, mas deixamos de ser fustigados e controlados por elas. Ou seja: deixamos de tocar o sino. Poderíamos acrescentar que o perdão nos deixa livres no presente para também perdoar no futuro, pois o perdão não joga com os números. (Mateus 18:21,22)

Nos tempos antigos, os rabinos ensinavam que bastaria que se perdoasse três vezes, o que provocou o questionamento de Pedro. Jesus, entretanto, elevou a questão acima do reino da computação prática, exigindo setenta vezes sete. Assim, em lugar de um perdão numérico, o crente deve seguir o padrão de Jesus (Lucas 17:4,5). Tomando-se o exemplo de Jesus e Pedro, poderíamos dizer que o perdão tem um efeito terapêutico (2 Coríntios 2:7).

A falta do perdão permite que o diabo leve vantagem sobre nós (2 Coríntios 2:10,11).  Assim, precisamos resolver esse problema dos sentimentos de raiva antes que Satanás se aproveite da situação. Inclusive, afirmamos que a falta do perdão nos torna azedos, amargos, pessimistas, vingativos, além de nos fazer pecar contra o próximo e contra a Palavra de Deus (Colossenses 3:13b e Mateus 6:12).  

Na verdade, o nosso perdão deve ser na mesma dimensão do perdão de Deus por nós  —  “Assim como...”   É uma realidade inquestionável: perdão gera perdão (Mateus 6:14 e Tiago 2:13)

 

 3.   O PERDÃO EMBELEZA A NOSSA INTERIORIDADE

 

O perdão tem um poder extraordinário de energizar a nossa personalidade, fazendo com que até mesmo o mais valente assuma uma postura de humildade diante do ofensor. Ele é capaz de esmagar o adversário com um “Eu te perdoo!”,  ou “Perdoa-me!”

Outra marca dessa personalidade energizada pelo perdão é a facilidade do primeiro tornar-se segundo, pois o perdão não apenas energiza, mas qualifica a personalidade. Essa marca embeleza a nossa interioridade, fazendo vazar do nosso coração os sentimentos mais nobres do fruto do Espírito (Gálatas 5:22,23), pois a verdadeira espiritualidade passa pelo fruto do Espírito.

O perdão nos torna capazes de ver o indivíduo (Atos 7:60), qualificando a personalidade na perspectiva de que aquele que invocava o juízo aprende a invocar a bênção. O perdão também nos faz livres para transitarmos dentro de nós mesmos com a ação libertadora da graça de Jesus em nós.

Num sentido contrário, quando somos ofendidos e não perdoamos, passamos a ter aquela pessoa como nossa inimiga e em pensamentos lançamos tal pessoa no nosso cárcere pessoal, começando ali a esbofeteá-la, e usando o chicote da vingança. E o problema maior é que ficamos presos a ele.

 

4.   AMARGURA: O VENENO DA ALMA

 

 

O que precisamos trabalhar com cuidado é o nosso sentimento de amargura (Efésios 4:31). O termo grego para amargura, aqui neste texto, é “pikria”, um termo figurativo que denota aquele estado irritado da mente, que mantém um homem em perpétua animosidade, que o inclina a ter opiniões duras e descaridosas acerca do outro e que o torna fechado, repulsivo em seu relacionamento com os outros, pessoa que fecha a carranca e infunde veneno às palavras de sua língua. (Hebreus 12:15)

Vamos entender que “raiz da amargura” é a parte invisível de uma planta destrutiva que produz um fruto venenoso. Quando deixamos de perdoar são plantadas fortes emoções negativas no fundo da nossa mente, tais como rejeição, raiva e ódio.  Essa amargura funciona como uma sementinha pequenina que se aloja em nossos corações e começa a criar raízes, sufocando todo nosso emocional e liberando os frutos da raiva e da vingança. Se não rejeitarmos essas emoções, elas crescerão e passarão a afetar nossa motivação, nossos pensamentos e nossos relacionamentos.

É importante entendermos que a ofensa recebida não nos destruirá, mas sim o ressentimento produzido por ela, que funciona como uma dinamite com efeito implosivo, e até com efeito explosivo, que nos joga para os ares. Dessa forma, devemos abortar do nosso coração, da nossa mente, aquela teologia de que “Deus vai pesar a mão naquele que é contra nós, vai esmagá-lo.” Esse sentimento não nos levará a lugar nenhum.

A chave que nos liberta dos poderes paralisantes da amargura e da ira é nos deixarmos ser absorvidos pela graça de Jesus, deixar-nos ser encharcados com o Seu amor, sermos vazados por sentimentos de misericórdia e de perdão.

Deus precisa curar nossos sentimentos, quando os tecidos da alma parecem estar ficando  necrosados,  infectados pelas malquerenças, pelas desforras, pelas palavras pesadas. Um outro termo grego para perdão é “charizomai”, que significa tratar graciosamente.

  

CONCLUSÃO

 

Os psicanalistas afirmam que a falta de perdão gera doenças psicossomáticas. Um certo pensador chamado Cordaire, disse: “Quer ser feliz por um momento? Vingue! Quer ser feliz para sempre? Perdoe!”

Como estamos orando o “Pai Nosso”? Lembre-se de que o perdão só brota de um coração misericordioso e vazado de amor (Lucas 7:47b). Temos tido a mesma atitude repulsiva do irmão do filho pródigo? A nossa espiritualidade passa pelo perdão, e se não for assim nos tornaremos apenas religiosos, sepulcros caiados de branco, segundo afirmou o próprio Jesus.

Nosso culto só será aceito a partir do momento em que mantivermos o exercício do perdão (Marcos 11:25), algo que deve ser espontâneo, assim como foi o de Deus por nós (Efésios 4:32). Se o perdão de Deus foi gerado no amor sacrificial, o nosso perdão também precisa passar por esse processo.

Para que haja ministração sincera do perdão, o coração precisa esgotar o seu ódio, seus ressentimentos, todos os sentimentos raivosos que o contraem, e depois ser cheio dos carismas da graça: amor, compaixão e misericórdia.

O perdão deve ser mais do que remissão da ofensa e da penalidade dela; deve ser a restauração da comunhão interrompida, pois o perdão produz uma comunhão comunicativa, e a verdadeira comunhão do perdão deve funcionar entre os planos vertical e horizontal: é o sino que não toca mais. Observe que Deus não apenas perdoou os nossos pecados, como também anulou a penalidade deles.

A vingança é de escravo; o perdão é de rei. Para a prática do perdão o que precisamos fazer morrer é o nosso ego, pois enquanto ele estiver cheio de “razão”, cheio de “verdades”, cheio de “autoridade”, absolutista, o perdão jamais acontecerá.

Encerrando, resumimos que o perdão tem três fases: a liberação, a decisão e a ação e que um dos sinais visíveis do Reino de Deus é o perdão (Mateus 6:12), como mostra a cena da mulher adúltera. O perdão libera a graça para os excluídos, para os estigmatizados, como o Ladrão na cruz.

Para pensar:  Se o nosso Deus não fosse um Deus perdoador, certamente o céu estaria vazio.

 

 

AUTOR

Rev. Esmael Salgado Arcas (1999)

 

 

Por: Esmael Salgado Arcas

Publicado em 10/04/2015

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